domingo, 21 de junho de 2009

Das Wiedersehen

Er – Süsse Freundin, noch einen, nur einen Kuss noch gewähre

Diesen Lippen! Warum bist du mir Heute so Karg?
Gestern blühte der Baum wie Heute; wir wechselten
Küsse tausendfältig; dem Schwarm Beinen
Verglichst du sie ja, wie sie den Blüten sich
Nahn und saugen, schweben und wieder
Saugen, und lieblichen Ton süssen Genusses
Erschalt. Alle noch üben das holde Geschäft.
Und ware der Frühlig uns vorübergeflohn,
Eh’ sich sie Blüte zerstreut?

Sie – Träume, lieblichen Freund, nur immer! Rede von gestern!
Gerne hör ich dich an, drücke dich redlich ans Herz.
Gestern, sagst du? – Es war, ich weiss, ein Köstliches Gestern.
Worte verklangen im Wort, Küsse verdrängte den Kuss.
Schmerzlich war’s zu scheiden am Abend, und traurig
Die lange Nacht von gestern auf Heut’, die den
Getrennten gebot. Doch der Morgen ist wieder erscheinen.
Ach! Dass mir indessen leider zehnmal der Baum
Blüten und Früchte gebracht!

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Rever

Ele – Por que estás hoje esquiva, ó minha doce amiga?
Concede um beijo mais a estes lábios famintos...
A árvore hoje, como ontem, tem os ramos retintos
de flores que alimenta, sustém, renova e abriga.
Comparavas meu beijo às abelhas inquietas
Que buscam sem cessar a flor dos teus amores,
Sussurrando, a zumbir, nas moitas prediletas
O seu canto de gozo, hino ao perfume e às cores...
Ébrio de azul, de luz, perfume que bebem,
O enxame sem descanso a faina continua...
Não há flores no chão, nenhuma planta nua...
Será que a Primavera só para nós morreu?

Ela – Aperta-me ao teu peito! Ontem nos separamos?
E a saudade é mais suave do que todo desejo.
Sonha, querido amigo! A lembrança de um beijo
É mais doce que todos os beijos que trocamos...
A noite sem piedade veio nos separar.
Foi tão triste, à tardinha, o nosso adeus de ontem!
Que as Primaveras sempre para nós dois repontem
Nas árvores, nas flores, nos frutos do pomar...

+*+Johann Wolfgang von Goethe+*+
Comigo me desavim*
seu posto em todo perigo;
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.

Com dor, da gente fugia,
antes que esta assim crescesse;
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.

Que meio espero ou que fim
do vão trabalho que sigo,
pois que trago a mim comigo,
tamanho imigo** de mim?

+*+Sá de Miranda¹+*+

*desavim – desentendi
**imigo - inimigo

¹Cancioneiro Geral
Relógio

As coisas são
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
As horas
Vão e vêm
Não em vão.

+*+Oswald de Andrade+*+
Cantiga de amigo

Quantas sabedes amar amigo
treydes comig’a lo mar de Vigo
e banhar nos emos nas ondas.

Quantas sabedes amar amado
treydes comig’a lo mar levado
e banhar nos emos nas ondas

Treydes comig’a lo mar de Vigo
e veeremo’lo meu amigo
e banhar nos emos nas ondas

Treydes comig’a lo mar levado
e veeremo’lo meu amado
e banhar nos emos nas ondas.

+*+Martin Codax+*+
Um mover de olhos, brando e piedoso,
Sem ver de que; um raio brando e honesto,
Quase forçado, um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;

Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravíssimo e modesto;
Uma pura bondade, manifesto
Indício da alma, limpo e gracioso;

Um escolhido ousar, uma brandura;
Um medo sem ter culpa, um ar sereno,
Um longo e obediente sofrimento:

Essa foi a celeste formosura
Da minha Circe, e o mágico veneno
Que pode transformar meu pensamento.

+*+Camões+*+
Cartas de um vidente [Lettres d’un voyant]

Oh estações, oh castelos,
Que alma é sem defeito?

Oh estações, oh castelos,

Eu fiz o mágico estudo
Da felicidade, que ninguém evita.

Ora viva ele, toda vez
Que canta o galo gaulês.

Mas não desejarei mais nada,
Ele tomou conta de minha vida.

Esse encanto! Fez-se de carne e osso,
E dispersou todos os esforços.

Como compreender minha palavra?
É preciso que ela fuja e voe!

Oh estações, oh castelos!

+*+Arthur Rimbaud+*+
imagem: Escultura de Igor Mitoraj
Estrela

Estrela que me nasceste
Quando a vista mal te alcança
Nessa abóbada celeste,
Onde a nossa última esperança...
Estrela que me nasceste
Quando a vista mal te alcança!

Antes nascesses mais cedo,
Estrela da madrugada!
E não já noite cerrada...
Que até no céu mete medo
Ver esta estrela isolada...
Antes nascesses mais cedo,
Estrela da madrugada!

+*+João de Deus+*+

sexta-feira, 19 de junho de 2009


Anseio
A Emygdio Monteiro

Oh quem me dera embalado
Nesse berço vaporoso,
Nuvens do céu azulado...
Onde meus olhos repouso
Já de tanto olhar cansado!

De tanto olhar à procura
De um bem que o fosse deveras;
De uma paz, de uma ventura
Dessas venturas sinceras,
Se as pode haver sem mistura.

Mas há, sem duvida: creio
Neste desejo entranhável!
Há de haver um rosto, um seio
De amor e gozo inefável
Donde mesmo este amor veio!

Este amor que a vós me prende,
Nuvens do céu azulado!
E a vós, lâmpadas, que acende
Depois do sol apagado
Quem... de Quem tudo depende!

+*+João de Deus+*+
Tristezas
A Sebastião Formosinho


Na marcha da vida
Que vai a voar
Por esta descida
Caminho do mar,

Caminho da morte
Que me há de arrancar
O grito mais forte
Que posso exalar;

O ai da partida
Da pátria, do lar,
Doa meus e da vida,
Da terra e do ar;

Já perto da onda
Que me há de tragar,
Embora se esconda
No fundo do mar;

De noite e de dia
Me alveja no ar
O fumo que eu via
Subir do meu lar!

Que sonhos doirados
Me estão a lembrar!
Mas tempos passados
Não podem voltar!

Carreira da vida
Que vais a voar
Por esta descida,
Vai mais devagar;

Que eu vou deste mundo,
Talvez, descansar,
E nunca no fundo
Dos mares voltar!...

+*+João de Deus+*+
Perdão

Seria o beijo
Que ti pedi,
Dize, a razão
(outra não vejo)
Por que perdi
Tanta afeição?
Fiz mal, confesso;
Mas esse excesso,
Se o cometi,
Foi por paixão,
Sim, por amor
De quem?... de ti!

Tu pensas, flor,
Que a mulher basta
Que seja casta,
Unicamente?
Não basta tal:
Cumpre ser boa,
Ser indulgente.
Fiz-te algum mal?
Pois bem: perdoa!

É tão suave
Ao coração
Mesmo o perdão
De ofensa grave!
Se o alcançasse,
Se o conseguisse,
Quisera então
Beijar-te a mão,
Beijar-te a face...
Beijar? Que disse!
(Que indiscrição...)
Perdão! perdão!

+*+João de Deus+*+
Enlevo

Não brilha o sol,
Nem pode a lua
Brilhar na sua
Presença dela!
Nenhuma estrela
Brilha diante
Da minha amante,
Da minha amada!

A madrugada
Quanto não perde!
O campo verde
Quando esmorece!
Quanto parece
A voz da ave
Menos suave
Que a sua fala!

A flor exala
Menos perfume,
Do que é costume
O seu cabelo...
Que basta vê-lo,
Prende-se a gente;
Prende-se e sente
Gosto inefável!

Que riso afável
Aquele riso!
Que paraíso
Aquela boca!
Penetra, toca,
Enche de inveja
Um ar que seja
Da sua graça!

Onde ela passa,
Aonde ela chega,
Quem lhe não prega
Olhos avaros?
Há dotes raros,
Rara doçura
Naquela pura,
Casta existência!

Oh! Que inocência
Que ela respira!
A alma aspira
Não sei que aroma,
Mal nos assoma
Ao longe aquela
Pálida estrela...
Que rege o mundo!

Nunca do fundo
Do oceano
Foi braço humano
Colher ainda
Perola linda,
Como a formosa,
Cândida rosa
Que eu amo tanto!

Não sei, de santo,
Que há no seu gesto...
No ar modesto
Daquele todo!
Naquele modo...
Que tudo esquece,
E nos parece
Estar no céu!

+*+João de Deus+*+
Adeus

A ti que em astros desenhei nos céus,
A ti que em nuvens desenhei nos ares
A ti que em ondas desenhei nos mares
A ti, bom anjo, o derradeiro adeus!

Parto! Se um dia (que é possível, flor!)
Vires ao longe negrejar um vulto,Alinhar ao centro
Sou eu que aos olhos desta gente oculto
O nosso imenso e desgraçado amor.

Talvez as feras ao ouvir meus ais,
As brutas selvas, as montanhas brutas,
Côncavas rochas, solitárias grutas,
Mais se condoam, se comovam mais!

E lá daquelas solidões se aqui
Chegar gemido que uma pedra estale,
Que um cedro vibre, que um carvalho abale,
Sou eu que o solto por amor de ti...

De ti, que em folha que varrer o ar,
Em rama, em sombra que bandeie a aragem,
De fito sempre nessa cara imagem
Verei sorrindo, sentirei passar!

De ti que em astros desenhei nos céus,
De ti que em nuvens desenhei nos ares!
De ti que em ondas desenhei nos mares,
E a quem envio o derradeiro adeus!

+*+João de Deus+*+
Pátria

Como o prodigo volta ao lar paterno
Desenganado do que em vão procura,
Eu já desfalecido nesta lida
De sonhos sobre sonhos de ventura,
Desejava dormir o sono eterno
Abrindo junto ao berço a sepultura!
Fechar em suma o círculo da vida
No saudoso ponto de partida!

Chegado pois, Senhor, aquele dia
Que se me apague a luz que me alumia,
Deixai-me descansar onde repousa
Meu santo pai, e sua terna esposa
– A minha santa mãe!
Ser-me-á assim mais leve a fria lousa...
Que a terra onde se nasce é mãe também!

+*+João de Deus+*+
Muito pedir

– Dá-me esse jasmim de cera,
Minha flor?
“Mas e depois, se lho dera,
Meu Senhor?

– Depois, era uma lembrança.
“Mas de quê?
– De uma tão linda criança,
Já se vê.

“Oh tão linda! Mas parece,
Sendo assim,
Que inda quando lhe não desse
Tal jasmim...

– Não me esquecia por certo.
“Nunca já?
– Nunca “Nunca é muito incerto,
Mas... vá lá.

– E a rosa, que bem lhe fica!
Dá-ma, flor?
“Oh a rosa, a rosa pica,
Meu senhor!

+*+João de Deus+*+
Deus?
A Marco Antônio Canini

Quem me terá trazido a mim suspenso,
Atônito, alheado... ou a quem devo,
Enfim, dizer que em nada mais me enlevo,
A ninguém mais do coração pertenço?

Se desço ao vale, ao alcantil me elevo,
Quem é que eu busco, em que será que eu penso?
És tu memória de horizonte imenso
Que me encheu alma dum eterno enlevo?...

Segues-me sempre... e só por ti suspiro!
Vejo-te em tudo... terra e céu te esconde!
Nunca te vi... cada vez mais te admiro!

Nunca essa voz à minha voz responde...
E eco fiel até do ar que aspiro,
Sinto-te o hálito... em minha alma ou onde?

+*+João de Deus+*+

Beleza em flor arrebatada

Beleza em flor arrebatada! O corpo
Jamais te há de esmagar pesada lousa!
Mas hão de as rosas sobre a leiva tua
Ser do ano as primeiras em dar folhas;
E o tristonho cipreste há de sobre ela
Ondear sua sombra merencória:

E muitas vezes há de a Dor, à borda
Dessas ondas azuis e murmurantes
Vir a fronte depois triste, abatida,
E, em longos sonhos alentando a mente,
Queda ficar para o depois de leve,
E docemente se partir, temendo,
Insensata! Que os passos seus – acaso
Possam dos mortos perturbar o sono!

Eia! inúteis são prantos – nós sabemos;
Nossas mágoas a morte jamais ouve
Ou delas se enternece; mas acaso
Calar devemos os queixumes nossos?
Ou verter uma lagrima de menos?
E tu mesma – que a esquecer me ensinas,
Tens na face o palor, nos olhos lágrimas.

+*+Lord Byron+*+
É triste minha alma

É triste minha alma – nas cordas da lira
Que ainda nos males suporto escutar,
Os dedos vibrando gentil e garboso
Teus cantos modula, Menstrel, de encantar.

Se grata esperança dormir ainda pode
Desta alma saudosa na feia solidão,
Os trenós da lira sonora, afinada
Do sono a esp’rança erguer-se farão.

Se a estes cansados e túrgidos olhos
Ainda uma lágrima é dado conter,
A lágrima quente vereis deslizar-se
Na face, deixando meu crânio de arder.

Modula, ó Menstrel, teus cantos sombrios,
Que as notas primeiras respirem só dor;
Preciso do pranto que mágoas apaga,
Não deixeis que o peito se alquebre de amor.

O peito nutrido nas dores pungentes
Que engendra o silêncio, que a insônia nos traz,
Agora que o transe mais cresce, ou se quebra -,
Ou cede à harmonia d’ encanto falaz.

+*+Lord Byron+*+

Som
Frio

Rio
Sombrio.

O longe som
Do rio
Frio.


O frio
Bom
Do longe rio

Tão longe,
Tão bom,
Tão frio
O claro som
Do rio
Sombrio!

+*+Cecília Meireles+*+
Não há vagas

O preço do feijão
não cabe no poema.
O preço do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema
o gás a luz o telefone
a sonegação do leite
da carne do açúcar
do pão
O funcionário publico
Não cabe no poema
Com seu salário de fome
Sua vida fechada
Em arquivos.

Como mão cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
- porque o poema, senhores,
Está fechado
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede nem cheira.

+*+Ferreira Gullar+*+
Renúncia

Chora de manso e no íntimo... procura
Tentar curtir sem queixa o mal que te crucia:
O mundo é sem piedade e até riria
Da tua inconsolável amargura.

Só a dor enobrece e é grande e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás um dia.
Então ela será tua alegria,
E será ela só tua ventura...

A vida é vã como a sombra que passa
Sofre sereno e de alma sobranceira
Sem um grito sequer tua desgraça.

Encerra em ti tua tristeza inteira
E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira...

+*+Manuel Bandeira+*+